AGLUTINAÇÕES

Aglutinação (do latim agglutinare para colar) designava, em meados do século XIX, o processo de encerramento dos bordos de uma ferida. Só em 1896 é que o termo será utilizado por Herbert Durham (1866-1945) e Max von Gruber (1853-1927) para descrever a capacidade do soro de animais previamente imunizados para agregar e inactivar bactérias. O termo designa actualmente qualquer reacção serológica em que ocorre agregação de uma suspensão de células por anticorpos específicos, dirigidos contra antigénios específicos.

As primeiras observações do fenómeno de aglutinação datam dos anos 60 e 70 do século XIX. Adolf Creite, em 1869, e Leonard Landois (1837-1902), em 1875, descrevem a forma como as hemácias de coelho são aglutinadas e destruídas em contacto com soro de gato, mas não com o soro do próprio coelho.

Ao longo dos 60 anos seguintes, entre 1870 e 1930, o estudo da aglutinação atrairá homens como Fernand Widal, Max von Gruber, Karl LandsteinerJules Bordet August Wassermann. A partir de evidências experimentais, elaborando teorias fisiológicas para as quais não tinham qualquer suporte molecular, lançam as bases da serologia infecciosa e do estudo e compreensão dos polimorfismos e introduzem métodos de diagnóstico, prevenção e terapêutica que, pela primeira vez, alteram radicalmente o relacionamento da medicina laboratorial com a clínica. Alguns dos métodos que desenvolveram ainda são usados actualmente ou estão na base de técnicas laboratoriais actuais.

Em 1887, Charrin estuda os mecanismos de resistência a infecções pelo Bacillus pyocyaneus (depois rebaptizado Pseudomonas aeruginosa) em coelhos expostos a suspensões da bactéria previamente aquecidas e filtradas e observa que o sangue desses animais provoca a aglutinação das bactérias, um fenómeno semelhante ao descrito antes por Creite e Landois.

Em 1896, Herbert Durham e Max von Gruber publicam o seu artigo. No mesmo ano, Fernand Widal descreve o teste, criado por si, para o diagnóstico de pessoas infectadas com febre tifóide, que utiliza a capacidade do soro dessas pessoas para aglutinar especificamente suspensões de Salmonella typhii. O trabalho de Widal despertou grande interesse e debate. Diversas comunicações surgiram nos anos seguintes para discutir a eficácia do teste e, sobretudo, a sua especificidade. Esse debate nunca acabou mas o teste ainda é utilizado.

Nos anos seguintes, à medida que o conhecimento dos mecanismos subjacentes aos fenómenos de aglutinação crescia e eram experimentados e publicados mais protocolos de execução, a sua importância e utilidade para a clínica foi-se tornando evidente. Delepine descreve várias técnicas para observação da aglutinação de bactérias, que não diferem muito das técnicas usadas actualmente, e Grunbaum relata que o soro pode ter que ser diluído para se obter um teste positivo.

Em 1900, Karl Landsteiner publica um artigo em que descreve pela primeira vez os seus trabalhos sobre a aglutinação de eritrocitos humanos. No ano seguinte identifica a existência de três grupos de sangue diferentes (o sistema AB0).

Em 1901, Bordet e Gengou desenvolvem o teste de fixação do complemento, que servirá a Wassermann para criar em 1906 o primeiro teste serológico para o Treponema pallidum.

Enfim, a técnica de hemaglutinação será desenvolvida em 1941 por George Hirst (1909-1994), durante as suas investigações sobre o vírus Influenza.

Todos estes avanços foram feitos sem que os seus autores tivessem qualquer conhecimento das bases moleculares destes fenómenos. Só nos anos 1930 é que os desenvolvimentos da técnica da electroforese permitirão identificar e isolar as moléculas responsáveis pela aglutinação – a que Landsteiner chamara, logo em 1900, anticorpos. Só na mesma época os mecanismos de interacção entre antigénios e anticorpos serão satisfatoriamente elucidados por John Marrack. E só nos anos 1960 é que a estrutura dos anticorpos será inteiramente caracterizada por Edelman e Rodney Porter.

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